Ele estava sentado na cadeira de madeira escura e balanceava o corpo, enquanto olhava para a folha branca, pálida, vazia, que se encontrava na pequena mesinha, também da mesma madeira escura. Tamborilava com os dedos no braço da cadeira ao mesmo ritmo que as imagens daquilo que queria tanto escrever passavam na sua memória. Mas não conseguia escrever…
Tudo aquilo que alguma vez disse e fez, gostaria de repetir naquela pálida folha… mas não conseguia.
Queria descrever o calor que sentia no peito de cada vez que a via, aquele intenso calor que parecia nunca desaparecer, mesmo lembrando apenas o momento, o sorriso. Queria descrever o cheiro dela, que inundava as suas narinas, e ficava nas suas mãos de cada vez que tocava nas dela. O cheiro, tal como a memória, fica. Queria ter podido dizer tantas coisas que nunca lhe disse, pedido as desculpas que nunca pediu, amar as vezes que não amou… mas não conseguia escrever. Aquela folha, de um imaculado branco, teria de continuar assim. Era a memória dele, como se, ao riscar naquela folha os factos, com a mesma intensidade com que os tinha vivido, os perdesse da sua vida.
Olhou, uma vez mais, para a pálida folha pousada na superfície escura da mesinha, e com um sorriso, levantou-se, vestiu o casaco de lã espessa, colocou a chapéu e saiu com as suas memórias.
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